"Só se vê bem com o coração; o essencial é invisível aos olhos"
Perdemos mais uma luta contra os terríveis carrapatos hoje. Depois de terem levado o Lampard, em 2005, hoje eles levaram meu xodó, a Raika.
Uma cadela de quatro anos que desde o dia em que chegou na nossa casa, em 2011, só soube nos dar todo o amor que ela tinha, daquele jeitão desengonçado que só uma mistura de Labrador com São Bernardo poderia resultar.
Ao longo desses quatro anos em que ela viveu, convivi menos com ela do que gostaria. Até um ano atrás, mais ou menos, eu tinha muito receio de qualquer cachorro, mesmo os menores, com medo de ser mordida. O medo passou quando o Nino chegou aqui em casa, mas ainda assim a Raika, com todo o seu tamanho, ainda me deixava receosa, porque seu amor por nós era tão grande que ela não tinha a menor ideia de que um "abraço" dela era capaz de derrubar qualquer um.
Eu sei que amei essa bonita do meu jeito, dando carinho e atenção da forma que eu conseguia, querendo ter mais mãos pra acariciar ela e o Luti ao mesmo tempo, já que atenção só para um deles significava reclamação do outro. E ela se esforçou pelo meu amor. Quando eu ia vê-los no canil, não havia um dia em que ela não se jogava nas grades pra receber carinho. Não houve um dia em que ela não reclamou por eu estar brincando só com o Luti. Não houve um dia em que ela não choramingou quando parei de dar carinho e entrar em casa.
Na verdade houve. Há alguns dias, ela começou a ficar meio mal, não comia e estava bem fraca. No último dia dela aqui em casa, fui até o canil ver como ela estava. E, ao me ver, ao contrário do que acontecia, ela não se moveu. Ficou paradinha em sua casa, apenas observando. Fui brincar com o Luti, que nesse momento já estava desesperado querendo carinho, e ela inerte. Já estava fraquinha, com uma anemia profunda, poupando energia para essa luta silenciosa, que às vezes a gente só vai perceber depois que já é tarde.
A última vez que a encontrei viva foi no domingo, quando fomos visitá-la na clínica onde foi internada. Estava bem debilitada, não tinha vontade alguma de comer, mas ao nos ver abanou seu rabinho, reconhecendo a família que tanto a amava. Foi difícil vê-la daquele jeito. Minha gorda bonita, cheia de saúde, com o pelo brilhante já não era mais a mesma. Acariciei a Raika como se fosse a última vez, já temendo pelo pior. E o pior veio hoje, depois de uma ameaça de recuperação. Enquanto mantínhamos a esperança de tê-la de volta antes do fim de semana, ela ia perdendo sua luta contra a doença do carrapato.
Ontem fui assistir ao filme O Pequeno Príncipe. É incrível como a história faz sentido quando temos uma situação parecida em nossa vida. A Raika era maravilhosa, eu sempre tive paixão por essa menina. E mesmo partindo hoje, ela sempre vai estar presente no meu coração. Ter visto o filme ontem me fez pensar, hoje, em como uma das frases mais famosas do livro faz sentido. Soube da sua morte por volta das 9h30 e resisti bravamente a um dia de trabalho tentando fugir desse entendimento, pois cada vez que eu concordava com a raposa: "Só se vê bem com o coração; o essencial é invisível aos olhos", eu queria chorar.
Ao chegar em casa, acompanhei seu enterro, me despedindo de um ser que me cativou e me ensinou um pouco sobre o amor incondicional. Não teremos mais a Raika correndo desengonçadamente pelo gramado, latindo sempre que alguém chegava tarde em casa, comendo laranjas e brincando com o Luti, querendo toda a atenção só pra ela. Mas todas as lembranças dela desses quatro anos vão ficar guardados em um cantinho especial na minha mente pelo resto da vida.